quinta-feira, 15 de setembro de 2022

IMPOSTOS DE (E PARA) SÃO PAULO

* Murilo Félix

A campanha lançada pelo governador Rodrigo Garcia para aumentar a parcela de impostos aqui recolhidos que a União devolve ao Estado de São Paulo tem antecedentes históricos e já figurou nos debates pela Proclamação da República. O empresariado que surgiu do dinâmico e lucrativo ciclo do café na segunda metade do século XIX almejava um país mais moderno, baseado no trabalho livre e em um pacto federativo mais justo, reivindicando uma reforma tributária.
Os republicanos paulistas já no século XIX se queixavam da mesma forma que o atual governo dos bandeirantes. Nos cálculos do governador Garcia, São Paulo arrecada impostos federais (IOF, II, IPI, IRPF, IRPJ, Cofins, PIS / Pasep, CSLL, INSS) e remete para Brasília nada menos que R$ 720 bilhões e recebe de volta apenas R$ 46 bilhões, "15 vezes menos do que a gente manda".
Considere-se que o bolo dos impostos federais não é repartido de forma proporcional à população dos estados. São Paulo, o mais populoso, com 47 milhões de habitantes, ou 22% dos brasileiros, recebe 15% do que remete. Já o Maranhão, com 7,1 milhões de habitantes (3,2% do total), envia R$ 6,6 bilhões e recebe o triplo de volta: R$ 21,4 bilhões. O Tocantins, com 1,6 milhão de moradores (0,7%), aufere muito mais: manda R$ 1,8 bilhão e embolsa R$ 8,1 bilhões.
Por certo, essa divisão tão disparatada é baseada na fórmula Robin Hood, de tirar dos ricos para dar aos pobres. No entanto, a reclamação do governo paulista faz sentido, por serem os números muito desproporcionais – e São Paulo recebe muitos migrantes dos demais estados e carece de obras investimentos não cobertos por seu orçamento de R$ 286 bilhões, engordado principalmente pelo ICMS.
A reivindicação repete, 135 anos depois, a queixa de delegados ao congresso de 1887 do Partido Republicano Paulista, fundado principalmente pelos fazendeiros do café que forjavam o mais próspero ciclo econômico da História do Brasil e seria uma forçai decisiva para a extinção da Monarquia. Na liderança desse movimento, destacou-se Manual Ferraz de Campos Salles, que iria ser presidente (governador) de São Paulo de 1896 a 1897 e depois o quarto presidente do Brasil (1898-1902), mas antes disso foi ministro da Justiça do governo provisório de Deodoro da Fonseca e um entusiasmado apoiador do marechal Floriano Peixoto na guerra de consolidação da República.
 Naquele congresso de 1887 do Partido Republicano reclamava-se da ínfima representação política nos governos monárquicos e da injustiça tributária. Enriquecendo com a lavoura cafeeira, São Paulo pagava impostos pesados e contribuía com a sexta parte da renda total que as províncias forneciam ao Império. Segundo anotação do professor Marcello Otávio N. de Basile, em História geral do Brasil, os paulistas remetiam 20 mil contos de réis e recebiam de volta apenas 3 mil contos – ou seja, 15% do total enviado.
Republicanos mais exaltados até cogitavam da separação, como, também por disputa de impostos, iria fazer o Rio Grande do Sul em 1836, ao proclamar a República de Piratini, só regressando ao seio do Império em 1845 ao fim de uma sangrenta guerra civil.
Felizmente, prevaleceu o bom senso, e São Paulo permaneceu como parte e locomotiva dessa nação fraterna e solidária que é o Brasil.  Quanto à questão dos impostos, é caso de sentar, discutir um novo perfil tributário e fazer um acerto de contas.

 * Deputado Estadual